Varejo perde força após 2 meses de relativa estabilidade, o que reforça a leitura de estagnação da economia brasileira. Hipermercados e vestuário puxam recuo.
Por Darlan Alvarenga e Daniel Silveira, G1
Vendas do comércio registram queda de 0,6% em abril; pior resultado para o mês desde 2015
As vendas do comércio varejista caíram 0,6% em abril, na comparação com o mês anterior, segundo dados divulgados nesta quarta-feira (12) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Trata-se do pior resultado para meses de abril desde 2015 (-1%) e também a primeira contração para o mês em quatro anos.
A queda acontece após uma alta de 0,1% em março e queda de 0,1% em fevereiro, na comparação com o mês imediatamente anterior, reforçando a leitura de perda de ritmo do setor e de estagnação da economia brasileira em 2019.
Na comparação com abril de 2018, houve alta de 1,7%. Dessa forma, o setor acumulou avanço de 0,6% no ano e de 1,4% nos últimos 12 meses.
O resultado veio pior do que o esperado pelo mercado. A mediana das estimativas de 27 analistas de consultorias e instituições financeiras ouvidos pelo Valor Data era de queda de 0,2% do indicador frente a março, quando houve ligeira alta de 0,1% (dado revisado).
Perda de ritmo
O IBGE revisou os resultados dos últimos meses. Em março, ao invés de uma alta de 0,3% como inicialmente divulgado, as vendas do setor avançaram apenas 0,1%. Em fevereiro, houve queda de -0,1% ante leitura anterior de estabilidade. Já em janeiro, a alta foi maior que a inicialmente divulgada, de 0,6%, e não de 0,5%.
A gerente da pesquisa, Isabella Nunes, destacou que a queda em abril ocorre após dois meses consecutivos de relativa estabilidade. “Só essa observação já nos mostra uma perda de ritmo no ano de 2019”, disse.
Estagnação do mercado de trabalho freia avanço do comércio, aponta IBGE
Em 12 meses, as vendas do varejo ficaram praticamente estáveis, acumulando alta de 1,4%, ante 1,3% em março.
Com o resultado de abril, setor está 7,3% abaixo do recorde alcançado em outubro de 2014. Segundo a gerente da pesquisa, isso equivale a um patamar semelhante ao que o setor operava em setembro de 2015.
Ela lembrou que no ano passado, no mesmo mês, o setor acumulava avanço de 3,4%.
“Ainda tem um longo caminho a ser percorrido para que o comércio varejista volte a registrar taxas semelhantes às de 2014 [quando o setor bateu seu recorde de vendas]”, afirmou.
Hipermercados e vestuário puxam queda
Das 8 atividades pesquisadas, 5 registraram queda no volume de vendas em abril, na comparação com março. Segundo o IBGE, a retração no varejo foi puxada pelo segmento de hipermercados (-1,8%), que caiu pela terceira vez seguida, e vestuário (-5,5%), que teve o segundo mês negativo.
Os números do IBGE também mostram que houve queda nas vendas em 20 das 27 unidades da Federação, com destaque para: Paraíba (-3,5%) e Rio de Janeiro (-2,8%) e Pará (-2,6%).
Segundo Nunes, desde a greve dos caminhoneiros no ano passado “os alimentos mostram uma evolução de preços”. Ela destacou que, em abril do ano passado, a inflação acumulada em 12 meses para os alimentos estava em -4,78%. Já em abril deste ano, o indicador registrou alta de 9,10%.
Conjunturalmente, enfatizou, o país tem um grande contingente de desempregados e um mercado de trabalho que segue estagnado. “Essa situação dificulta o crescimento da massa de rendimentos, que é o que impulsiona o consumo”, afirmou a pesquisadora do IBGE.
O indicador de vendas do comércio varejista ampliado, que inclui as atividades de veículos, motos, partes e peças e de material de construção, ficou estável em abril, na comparação com o mês anterior.
Por sua vez, a receita nominal do varejo caiu 0,3% na passagem de março para abril. No confronto a março de 2018, a receita do setor teve alta de 7,1%.
Veja o desempenho de cada segmento em abril:
- Combustíveis e lubrificantes: 0,3%
- Hipermercados, supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo: -1,8%
- Tecidos, vestuário e calçados: -5,5%
- Móveis e eletrodomésticos: 1,7%
- Artigos farmacêuticos, médicos, ortopédicos e de perfumaria: -0,7%
- Livros, jornais, revistas e papelaria: 4,3%
- Equipamentos e material para escritório, informática e comunicação: -8%
- Outros artigos de uso pessoal e doméstico: -0,4%
- Veículos, motos, partes e peças: 0,2%
- Material de construção: 1,4%
“Todas as atividades estão em trajetória descendente [em 12 meses], à exceção de outros artigos pessoal e de uso doméstico, a única que mostra crescimento, mas que tem pouca participação na receita total do setor”, destacou a gerente da pesquisa, explicando que grande deste último segmento é representada pelas lojas de departamento, virtuais e físicas, que vendem uma gama variada de produtos.
Incertezas e perspectivas
Os primeiros indicadores de maio mostram que a atividade econômica segue em ritmo lento, com um nível de consumo ainda bem abaixo do período pré-recessão, em meio à incertezas sobre o ritmo de tramitação de reformas no Congresso e elevado desemprego.
A produção industrial cresceu 0,3%, em abril, na comparação com o mês imediatamente anterior, mas o avanço foi insuficiente para recuperar a perda de 1,4% de março. Nos 4 primeiros meses de 2019, o setor industrial passou a acumular uma queda de 2,7% frente ao mesmo período de 2018.
O 1º trimestre foi marcado por uma perda de força da economia, reforçando a leitura de uma atividade econômica estagnada. O PIB (Produto Interno Bruto) recuou 0,2% nos 3 primeiros meses do ano, na comparação com o 4º trimestre, a primeira retração da economia desde 2016.
O índice que mede a confiança do comércio voltou a cair em maio, retornando ao mesmo nível de setembro de 2018, segundo pesquisa da Fundação Getulio Vargas (FGV).
De acordo com a última pesquisa Focus do Banco Central, o mercado reduziu a projeção de alta do PIB em 2019 para 1%. Foi a 15ª queda consecutiva do indicador. E parte dos analistas já fala em PIB abaixo de 1%, abaixo do resultado registro em 2017 e 2018, quando a economia cresceu 1,1% em cada um dos anos.
Por que o Brasil não cresce?